sexta-feira, 16 de maio de 2014

O IMPORTUNO
          Certo indivíduo, conhecido como vivedor, aboletou-se no caminho de sua vida, no solar de um homem bonacheirão e abastado, que lhe abrira as portas para um descanso ligeiro.
      Nos primeiros dias, o dono suportou galhardamente o hóspede, oferecendo-lhe a melhor cama, o melhor vinho, os melhores charutos. Passada, porém, a primeira quinzena, começou a pensar em um meio, que não fosse grosseiro, de livrar-se do importuno, e achou-o.
       Tinham os dois acabado de almoçar e repousavam, lendo jornais e fumando “havanas”, à sombra das árvores. De repente, o hospedeiro recosta-se pesadamente na cadeira, cerra os olhos, deixa cair a folha e o charuto, simulando um sono profundo. E, como em sonho, principia a falar:
          – Vejam só: que maçada! Esse cavalheiro vem, aloja-se em minha casa, come, bebe, fuma, diverte-se, e nada de entender que sua presença já me está sendo desagradável. Será possível que ele não compreenda isso?
          E, soltando um suspiro, pulou da cadeira, esfregando os olhos:
          – Que diabo! É eu dormir depois do almoço, vêm-me logo os pesadelos. E que sonho mau tive eu! Parece até que falei alto, não?
          E o outro, que de cenho cerrado prestava atenção a tudo:
          – É exato: você esteve por aí falando; e eu, como vi que se tratava de cousas de sonhos, procurei não ouvir para não ser indiscreto. As palavras dos homens só têm valor, mesmo, quando eles as proferem acordados.
       E o hóspede continuou na casa por mais três anos e quatro meses, isto é, até a transferência da propriedade, comendo do melhor prato, dormindo na melhor cama, bebendo do melhor vinho, fumando os melhores charutos.
HUMBERTO DE CAMPOS. In: Cleófano de Oliveira. Flor do Lácio. 6a. Edição, Saraiva, São Paulo, 1961.
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Após a leitura do texto, resolva as questões a seguir:
1. Identifique, no texto, as palavras que possuem estes significados:
a) bondoso, paciente, bonachão
b) pessoa que importuna, incomoda
c) situação desagradável, cansativa
d) rosto, cara, fisionomia

2. O texto conta que um homem…
a. (   ) foi convidado para repousar por breve período e acabou apoderando-se de todos os bens do hospedeiro.
b. (   ) aproveitou-se da boa educação do outro, permanecendo como hóspede até a transferência da propriedade.
c. (   ) não podia dormir depois das refeições, pois costumava ter pesadelos.
d. (   ) vendeu todos os bens porque estava cansado de hospedar um homem conhecido como aproveitador da bondade dos outros.

3. Para se livrar do hóspede importuno, o hospedeiro fez um plano. Em  que consistia esse plano?

4. Por que o hospedeiro incluiu um sonho no plano?

5. O plano criado pelo hospedeiro tinha chance de dar certo? Explique.

6. O hóspede ignorou o que o hospedeiro falou enquanto esse fingia que dormia. Por quê?

7. Qual a intenção do escritor ao escrever esta história?
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Gabarito
1. a) bonacheirão        b) importuno       c) maçada        d) cenho
2. alternativa B
3. Fingir que falava dormindo e, dizer o que pensava da situação.
4. Porque não tinha coragem de expor, de viva voz, o que pensava.
5. Nesse caso, não. Porque o hóspede tinha a intenção de permanecer na casa e naturalmente só sairia mediante imposição firme e decidida.
6. Porque lhe interessava permanecer como hóspede e sabia que o hospedeiro nada lhe falaria, cara a cara, acordado.
7. Demonstrar que é preciso agir com coragem, firmeza e decisão para evitar que outros abusem da nossa bondade ou de nossos escrúpulos.
A RECOMPENSA
          Josias usava a abusava da solicitude da mulher. Costumava levar uma pá de clientes para jantar, em sua casa, e com eles chegava em cima da hora, sem que Isaura os esperasse. Uma noite apareceu com três.
       Enquanto bebericavam, Isaura vasculhou a geladeira e constatou que a carne e a sobremesa estava “no aro”. Chamou os filhos e recomendou:
          – Escutem aqui: o pai trouxe os amigos dele para jantar, a carne está no fim, não vai chegar para todos nós; por isso, quando a mãe oferecer bife à milanesa para vocês, não aceitem. Vejam bem: vocês não vão querer carne, mesmo que a mãe insista. Certo?
          – Certo, sim senhora.
         Achando que fora bem explícita para aquelas cuquinhas de sete, seis e quatro anos, reforçou o prato com um encorpado molho parmesão e serviu o jantar.
          A recusa dos pequerruchos era tão veemente que…
- Josias, não sei o que está havendo com essas crianças; na certa andam lambiscando por aí…
Correu tudo muito bem, Isaura relaxou o seu estado interior… e lembrou-se da sobremesa.
Era o pudim de que os meninos mais gostavam e com o problema gravíssimo da carne, a pobre se esquecera do outro.
          À hora de servi-lo, encarou os filhos: olhinhos arregalados e sorridentes, esperavam o doce, o prêmio de bom comportamento e obediência. Dominou o pequeno pânico incipiente, juntou os sobrolhos e disse com firmeza:
          – Vocês digam boa-noite e subam já, já, para o quarto; é um castigo; quem não come carne não ganha sobremesa…

Lourdes Strozzi. Aspas, parênteses e reticências. Curitiba, 1977.
1. No texto, a palavra bebericavam significa:
a. (   ) molhavam os lábios sem beber.
b. (   ) bebiam de pouquinho em pouquinho.
c. (   ) engoliam a bebida num só gole.

2. Identifique, no texto, as palavras que tenham os significados abaixo:
a) clara, visível, expressa
b) forte, enérgico, vigoroso
c) terror, medo incontrolável

3. Josias costumava levar clientes para jantar em sua casa e…
a. (   ) trazia comida pronta
b. (   ) nunca avisava Isaura
c. (   ) sempre avisava a esposa
d. (   ) raramente avisava Isaura

4. Isaura fez um acordo com os filhos. Qual foi esse acordo?
5. Por que Isaura propôs esse acordo?
6. Tudo correu bem até que surgiu outro problema. Qual foi esse problema?
7. Os meninos sofreram um castigo por culpa:
a. (   ) de Josias, que levou três clientes para jantar e não avisou a esposa.
b. (   ) de Isaura, que conhecia o costume de Josias e não se preparou.
c. (   ) deles mesmos, pois não conseguiram cumprir o acordo feito.

d. (   ) dos três clientes de Josias, que chegaram sem ter avisado.

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