“SEU” JOCA
1. Desde mocinho que o
“Seu” Joca tocava pandeiro na bateria de uma escola de samba. Quando ele era
moço fazia um sucesso danado: virava cambalhota, jogava o pandeiro pro alto,
fazia pirueta, todo mundo gostava de ver. Mas foi ficando velho: jogava o
pandeiro pra cima e quem diz que pegava de volta? Era só fazer pirueta que
trançava uma perna na outra e se estatelava no chão. Então o pessoal da Escola
mandou:
2.
– Esquece pirueta, cambalhota, não joga mais nada pro alto, “Seu” Joca. Só
batuca e pronto, tá?
3. “Seu” Joca obedeceu. A
coisa que ele mais adorava na vida era fazer parte da bateria da Escola. Ele
não tinha família, morava numa casinha muito ruim, ganhava pouco dinheiro, o
trabalho no Zoo era chato, a grande curtição era sair com a Escola no Carnaval.
Então, tudo que diziam para ele fazer, ele fazia; topava qualquer coisa
pra continuar tocando na bateria.
4.
O tempo passou. “Seu” Joca ainda ficou mais velho; deu pra batucar mal. Um dia,
quando ele chegou ao ensaio, disseram:
5.
– Agora não dá mais pé, “Seu” Joca. Esse negócio de batuque é coisa pra moço.
Aproveita o carnaval pra ficar em casa descansando, tá?
6. “Seu” Joca foi pra casa de
cabeça baixa. Não dormiu a noite toda. Só de tristeza. E a toda hora os
vizinhos ouviam um barulhinho – pin: era uma lágrima do “Seu” Joca caindo no
chão.
7. No dia seguinte, logo
que chegou ao Jardim Zoológico, “Seu” Joca foi olhar o Pavão (ele costumava
dizer que pra curar tristeza a gente deve olhar coisa bonita). Olhou, olhou. De
repente, teve uma ideia maluca: se assustou, nem quis pensar nela outra vez. E
empurrou a ideia pro fundo do pensamento, mas ela teimou e voltou. E ficou. Era
a ideia de roubar o Pavão. De noite “Seu” Joca foi à Escola de Samba, juntou o
pessoal e falou:
8. – Negócio é o seguinte:
nossa Escola é pobre, nunca fez boa figura no carnaval. Se a gente tivesse
destaque a coisa era diferente. Mas destaque precisa de fantasia de luxo;
fantasia de luxo custa uma nota alta; quem tem nota alta vai pro Salgueiro,
Mangueira. Torce o nariz pra uma Escola feito a nossa.
9.
– Que tanto blablablá é esse, “Seu” Joca?
10. – Negócio é o seguinte: se vocês me
deixam na bateria, tocando o pandeirinho que toda a vida eu toquei, eu arranjo
um destaque superlegal pra nossa Escola.
11. O pessoal quis ver o
destaque. “Seu” Joca mostrou um retrato do Pavão (tinham tirado uma porção de
retratos do Pavão lá no Zoo; “Seu” Joca pediu um, ninguém disse não). O pessoal
ficou bobo (era retrato colorido, o Pavão estava uma maravilha); nem acreditaram:
12.
– Você traz ele pra destaque, “Seu” Joca?
13.
– Amanhã mesmo.
14.
– Negócio feito! – e apertaram mão e tudo.
(NUNES, Lygia Bojunga. A Casa da Madrinha. Editora
Agir, Rio de Janeiro, 1983)
Depois da
leitura atenta do texto, responda estas questões.
1. Na
frase: “… topava qualquer coisa para continuar…” (parág. 3) a palavra em
destaque significa:
a.
( ) tropeçar b.
( ) concordar c. (
) encontrar
2.
Substitua, nas frases, a expressão em negrito pela palavra adequada que damos
abaixo:
aborrecido
– acabrunhado – aceitava – desprezava – é possível – passou a
a. O
trabalho de “Seu” Joca no Zoo era chato.
b. Para
tocar na bateria, “Seu” Joca topava qualquer coisa.
c. Agora
não dá mais pé, “Seu” Joca!
d. “Seu”
Joca foi para casa de cabeça baixa.
e.
Depois, “Seu” Joca deu de batucar mal.
f. Quem
tinha dinheiro, torcia o nariz para essa escola.
3.
Localize e transcreva do texto as palavras que tenham os significados abaixo:
a. volta
que se dá com o corpo, de cabeça para baixo: ______________
b. giro
do corpo sobre um dos pés: ______________________________
c.
treinamento para se obter perfeito desempenho: _________________
d. gota
de líquido segregada através dos olhos: ___________________
e. figura
ou assunto importante, de realce: ________________________
4. “Seu”
Joca não recebia dinheiro como integrante da escola de samba. De que ele vivia
então?
5. Os dirigentes da escola de samba pediram para o
“Seu” Joca não fazer piruetas, dar cambalhotas e atirar o pandeiro para o alto.
Por fim eles ainda deram outra ordem. Qual foi? E por quê?
6. “Seu”
Joca teve uma ideia maluca, surgida:
a.
( ) quando o proibiram de tocar na escola de samba.
b.
( ) durante a noite em que ficou acordado e chorando o tempo todo.
c.
( ) no dia seguinte, no Zoo, ao olhar o pavão para curar a
tristeza.
d.
( ) quando lhe disseram que escola de samba precisava de um
destaque.
7. Quando
surgiu a ideia de roubar o pavão, “Seu” Joca tentou empurrá-la para o fundo do
pensamento, mas não conseguiu. Por quê?
8. O discurso de “Seu” Joca foi importante, mas
alguma coisa a mais foi necessário para que o pessoal da escola concordasse com
sua proposta. O que foi?
9. A
autora da história procura mostrar que:
a.
( ) a idade não serve de referência para estabelecer o momento de
uma pessoa encerrar suas atividades.
b.
( ) há pessoas capazes de cometer atos ilícitos para preservarem o
que lhes é muito importante.
c.
( ) as tristezas são mais facilmente curáveis quando se utiliza a
beleza para tratamento.
d.
( ) o roubo é perdoável quando praticado para a satisfação de uma
necessidade.
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